Você sabia que na maioria das coletas para exames de sangue não é necessário a realização de jejum?
Não fazer o jejum obrigatório representa uma liberação tanto para uma alimentação prévia, que pode até ser absoluta, quanto para coletas de sangue em serviço de urgência, deixando de lado a pausa sem alimentos por até 12 horas. Importante ressaltar que nem todos os exames necessitam de jejum, o que otimiza o momento para o diagnóstico e até a forma do serviço prestado pelo laboratório.
Em 2012, quando houve a publicação do estudo canadense que envolveu mais de 200.000 homens e mulheres com jejum variando de 1 a 16 horas e dosagens de lipídios em intervalos de uma hora, foram vistas muitas evidências do pequeno impacto do jejum na dosagem do colesterol total e do colesterol HDL (2%), bem como do LDL. Em dezembro de 2016, com a publicação do Consenso Brasileiro para a Normatização da Determinação Laboratorial do Perfil Lipídico pelas sociedades médicas de Patologia Clínica, Cardiologia e Endocrinologia, foi dado o parecer sobre a flexibilização do jejum para avaliação do Perfil Lipídico. Considerando que no estado de não jejum, ou estado alimentado, o paciente está mais exposto aos níveis de lipídeos em comparação com o estado de jejum, podemos afirmar que o impacto no risco cardiovascular é potencialmente maior e mais representativo no estado de não jejum (alimentado). De acordo com a definição da literatura, temos duas situações em que o jejum é dispensável para a avaliação do perfil lipídico, quais sejam para:
– Estimar o risco inicial em um paciente não tratado para fazer uma avaliação preventiva;
– Esclarecer um diagnóstico de síndrome metabólica.
O jejum seria mais interessante para: rastrear e acompanhar paciente com história familiar de hiperlipidemia genética ou doença cardiovascular aterosclerótica prematura; avaliar o risco residual em paciente tratado; avaliar paciente em risco ou com pancreatite; e diagnosticar hipertrigliceridemia. Portanto, cabe ao médico estabelecer o critério para a realização do perfil lipídico de acordo com o contexto clínico do paciente. Vale destacar também que o jejum acima de 16 horas não é recomendado para a maioria dos exames.
Hoje ainda temos poucos exames que necessitam de jejum obrigatório, como o de glicemia, devendo ser feita a pausa na alimentação de 8 horas, preferencialmente pela manhã. Os demais podem ser realizados em diferentes horários, disponibilizados pelo atendimento e cuja decisão seja aceitada pelo médico, com base em critérios para avaliação e diagnóstico. O laboratório pode atender clientes em vários horários da agenda para realizar a coleta referente a: sorologia de doenças infecciosas, maioria das dosagens hormonais, pesquisa de imunoglobulinas específicas, testes de alergia e provas bioquímicas de função hepática e renal, dosagem de eletrólitos, testes de coagulação e hemograma. Outros exames que se incluem nesse grupo são as pesquisas de anticorpos, por exemplo, autoanticorpos e antígenos.
Alguns dos exames mencionados são indicados em situações de urgência e emergência e, por esse motivo, interpretados sem a necessidade do jejum. Cabe lembrar que, no caso da glicemia (para diagnóstico de diabetes), o jejum mínimo ainda é de 8 horas, mas a determinação da hemoglobina glicada pode dispensar o jejum. Certos exames, devido a critério de metodologia, permanecem com a recomendação do jejum de 8 horas, como o de folato, insulina, ferro, zinco, ácido ascórbico, haptoglobina e hormônio do crescimento. Outros critérios pré-analíticos – como o preparo para o PSA, a interferência do ritmo circadiano em alguns exames, a fase do ciclo menstrual e o contexto metabólico do paciente como um todo (presença de doença crônica, restrição ao leito, medicamentos e atividade física) – permanecem na avaliação pré-analítica.
Benefícios da flexibilização do jejum para:
– Laboratório: Redução na demanda de coletas matinais e melhor distribuição do trabalho.
– Paciente: Aumento do conforto do paciente no preparo e horário para ida ao laboratório; e redução do tempo de espera para retorno com resultados.
– Médico: Melhora da adesão do cliente às avaliações de rotina preventiva e aconselhamento em tempo mais curto.
Outras recomendações importantes para coleta de exames:
– Conversar com o médico sobre o preparo do exame e escutar a opinião sobre o jejum.
– Evitar a prática de exercício físico extenuante nas 24 horas que antecedem o exame.
– Comunicar ao médico e ao laboratório os medicamentos em uso.
– Não exagerar na bebida alcoólica nem alterar hábitos alimentares nos dias que antecedem o exame.
– Caso os hábitos tenham mudado ou realizado procedimentos que possam interferir, aguardar o período para o organismo se readaptar.
Referência: 1. Fasting or Nonfasting Lipid Measurements – It Depends on the Question-Driver, S.L. et al. J Am Coll Cardiol. 2016; 67(10):1227–34 2. Consenso Brasileiro para a Normatização da Determinação Laboratorial do Perfil Lipídico versão 1.13, Dezembro 2016, disponível em http://www.sbpc.org.br/upload/conteudo/consenso_jejum_dez2016_final.pdf